Capítulo V - Sorrisos

-(Deve ser o sono ou a pancada na cabeça, só pode...)- Elisha pensava consigo mesma ainda não acreditando na sua imagem macabra que a encarava do outro lado do espelho.

-Essa sua mania de justificar tudo pela “ciência” é irritante.

Era obvio que a imagem conseguia ler a mente da garota, ela se deixou escorregar pelos azulejos do banheiro e se sentou no chão, respondendo ironicamente, decidindo entrar nesse jogo:

-É difícil justificar monstrinhos q aparecem em espelhos.

O reflexo riu e respondeu rapidamente:
-Adorei seu senso de humor. Você não se ama muito né? Não diga monstrinho, eu e você somos lindas! – Falava com a voz idêntica a da menina agora, a boca costurada não tinha aberto nenhum pouco se quer só esboçado um sorriso assustador.

-Se você não é “monstrinho”, o que você é? – Retrucou ela decidida a prosseguir com o dialogo.

-Já respondi essa! Eu sou você.

-Quero saber seu nome... Pra mim você é uma alucinação, não entendo o que você quer dizer com isso...

-Nome? Me esqueci dele, me chame de alucinação se quiser. É simples, se eu sou você, quem é você?

-Quem sou eu? Não sei... Eu... – O reflexo havia pegado Elisha nessa questão.

Ela não sabia como responder. Começou a se recordar das coisas q diziam dela na escola:
“Srta. Sayonomi, nº 07?”,
“Você é um pedaço de mau caminho.”,
“Parece que os rumores sobre vampiros eram verdade!”,
“Ela é bem anti-social né?”,
”Ela devia aproveitar mais a vida !”,
“Uma metida, isso sim. Só porque é bonitinha se acha melhor que a gente.”,
“Por que você está sempre sozinha, Elisha-chan ?”

Essas lembranças a irritavam. Ninguém entendia nada sobre ela, a julgavam pelo que ela aparentava ser e nem ao menos tentavam compreender os motivos.
Sua alma estava torturada, ela não tinha amigos, parentes, se ela deixasse de existir provavelmente ninguém notaria. Estranhamente ela desejou que Yuna estivesse viva ainda, talvez se ela tivesse sido menos rude... Quem sabe.

-Ninguém... – Respondeu ela como se não ligasse.

-Já pensou na hipótese de você ser uma minazinha covarde que se fecha porque tem medo de sofrer mais ainda? – As palavras a acertaram como flechas, de certa forma.

-Talvez seja, mas eu não quero ser igual aos outros. É idiotice.

-Não precisa ser igual. Você é mais divertida que eles. –Disse o reflexo colocando uma das mãos pra apoiar o rosto.

-Por quê? Se são eles que fazem idiotices tipo se embebedar por diversão e falar coisas ridículas só pra levarem um ao outro pra cama.

O reflexo gargalhou, como se achasse tudo que a garota dizia engraçado, mas parou ao ver que a própria Elisha estava sorrindo. Quanto tempo fazia ela não havia sorrido daquela forma?

-Tá rindo por quê? – Perguntou o reflexo ainda mais interessado.

-Porque essa foi a coisa mais ridícula que me aconteceu. Conversar com um reflexo demoníaco meu!? – Respondeu a garota rindo um pouco, achando que realmente tinha enlouquecido.

-Veja pelo lado bom, a sua solidão acabou.

-Se você sou eu, então eu ainda estou sozinha.

Elisha começou a ouvir os risos de novo e se levantou, ignorando aquela insanidade e lavando a testa pra poder fazer algum curativo.
Depois ela foi direto dormir, aquele dia tinha sido esquisito demais e não seria surpresa caso tenha sido só um sonho. Ela até concordou com o Joe achando que realmente estava bêbada, antes de cair no sono de novo.

O dia chegou rápido, e Elisha repetiu a rotina, indo para escola.
Logo na entrada, Joe estava conversando com Ryo Sada, que era irritante igual ao colega, mas ao contrario dele, Ryo tinha coração mole e bom.

-O que foi na cabeça, cara? – Perguntou Ryo passando as mãos pelos próprios cabelos castanhos claros meios compridos, olhando pra Joe que estava com a cabeça enfaixada.

-Ah cara... Caí de bicicleta.

Elisha levou imediatamente as mãos aos lábios, para abafar os risos.
Parecia que ela estava rindo com mais facilidade desde o dia anterior, e ele notou isso.
Foi para o banheiro feminino pensando se ele tinha tentado estuprar a bicicleta também ou se ele era “macho” demais pra falar a verdade.
Ficou rindo um pouco em frente ao espelho do banheiro vazio até que ouviu:

-Hmmm... Então você também ri de vez em quando, Sayonomi-san?

-E o que tem demais? – Perguntou ela parando de sorrir pra Yuriko Kanagawa, a nº 26, que havia entrado no banheiro e a visto sorrindo.

Yuriko estava muito abatida com a morte de Yuna no dia anterior, hoje ela parecia melhor. Estava com os cabelos castanhos bem claros soltos, balançando pelas suas costas e seus olhos da mesma cor demonstravam alguma animação, mesmo com a morte da amiga. Secretamente, era Yuna que sonhara em ver Elisha sorrindo, e o fato de ela ter presenciado essa cena pela amiga, a fez se sentir melhor. Yuna devia estar feliz.

-Nada, mas é raro ver você demonstrar sentimentos. - Yuriko pensou em contar o tal segredo pra Elisha, mas preferiu mudar de assunto rapidamente. Péssima idéia. – É por causa de homem né?

Elisha ouviu a voz do seu outro eu xingando a mania das mulheres de falarem sobre homens e ficou em silencio, deixando Yuriko continuar.

-Você devia arrumar um namorado, Sayonomi-chan. Tipo o Taichi, ele é perfeito!

Taichi era o namorado de Yuriko, eles eram extremamente apaixonados e ele era um cara legal. Mas aquele assunto ea muito desagradável aos ouvidos de Elisha ela odiava assuntos melosos e não entendia o que as outras meninas viam de tão interessante em homens. A única coisa que ela conseguia sentir por eles era nojo.
Ela deixou Yuriko lá falando sozinha sobre as qualidades e feitos do namorado
, felizmente ela não entendeu que aquilo foi proposital e disse um:

-Te vejo na aula tá? – Pra Elisha ao vê-la saindo.

As aulas acabaram rápido e Elisha já estava saindo do colégio, pensando em contratar os professores pra fazê-la dormir de noite, eles realmente sabiam como deixá-la com sono.

-Acorda!

A voz dentro da sua cabeça foi seguida por uma buzina bem alta, e quando ela percebeu, já estava no meio da rua com um caminhão a menos de 5 metros de distancia dela.
A garota só teve tempo de murmurar pra si mesma:

-Merda...