terça-feira, 28 de julho de 2009

Capítulo XVI - Traição

O cheiro de morte alcançou o olfato dela, via apenas luz, seus olhos estavam ofuscados, ela tinha morrido. Aquele perfume tão familiar do quarto de Yuna misto com um outro que ela tinha esquecido fazia um tempo. Uma cena clichê, cabelos claros flutuando no ar acompanhados por um vestido branco leve e longos cabelos negros com um vestido negro imitando aquele mesmo movimento. Duas mulheres, as duas únicas que a amaram de verdade. Ia finalmente se encontrar com elas naquele doce e carinhoso abraço que a morte tinha lhe dera.

-Ainda não Elisha. – Vozes ritmadas, ainda mais clichê.

-Hora de acordar guria. – Ela via o rosto de Victoria, sentia o próprio cheiro dela, mas a voz era de Irene – O jogo ainda não acabou pra nós.

Parecia aquele dia em que elas dormiram sob o mesmo teto pela primeira vez e ela acabou acordando com Vic cutucando sua boca com o dedo... Como ela sentia falta daquela garota... Parecia mesmo um sonho distante agora.

-Abre os olhos supergirl. – O rosto de Vic era nítido.

-Não sei por que, mas acho que você tava sonhando comigo. – A voz agora era de Victoria, ela parecia tão real. Ela pôde até segurar a mão da garota e tira-la de sua boca, aquela pele macia e delicada... Era real demais pra ser um sonho.

-Eu morri? – dores vieram quando ela se sentou, estava numa cama com um vestido azul claro esquisito.

-Sim, uma vez. – respondeu Victoria, estava vestida com uma saia e botas pretas, camiseta vermelha com uma jaqueta preta jogada por cima, ambas regatas e a gargantilha de sempre – Mas gatas tem nove vidas.

-O que... – Estava confusa, viu a cama, as janelas, as roupas e tinha aquele cheiro de morte. Ambiente familiar.

-A casa explodiu e ninguém sabe como, mas você escapou ilesa. – Vic explicou rápido – Você devia estar toda queimada agora no mínimo. – Elisha não acreditava, estava sem forças, mas tentou segurar a mão dela firme pra ver se era mesmo verdade – Acho que os espíritos do Halloween te protegeram. Um em particular.. – A ultima frase foi um sussurro.

-E o que você ta fazendo aqui? – Sua voz estava fraca.

-Você nem imagina? – Vic riu-se – Eu estava por perto. Foram as duas que não saíram daqui um segundo sequer, nem pra me deixar sozinha com o seu corpo. – Ela apontou com a cabeça para Emily, que estava com Morrigan no colo, sentada num canto afastado olhando pra Elisha um pouco emocionada. Já a gata estava acomodada folgadamente no colo da professora apreciando as caricias. – A má noticia é que você perdeu a casa e suas despesas pagas, a boa é que agora você é órfã.

-Ele... – Elisha não sentiu nada, nem um pingo de emoção.

-Segundo os peritos estava morto antes da explosão.

-Tudo bem, ele tinha seguro... – Mesmo cabisbaixa não sentia nada – Por que você não me contou? Da Black Rose e do tal ritual que fez Yuna morrer?

-É uma longa historia depois te conto. – Ela não queria mesmo tocar no assunto – O que importa é que você ta bem. – Sorriu – Ia me dizer algo pelo celular?

-Não era nada... –
mentiu.

Nem teve tempo pra se xingar, Victoria a envolveu com os braços bruscamente, sua costelas até doeram um pouco pela fragilidade. Mas não importava. A garota apertava Elisha contra si mesma com força parecia que nunca mais ia soltá-la e a garota retribuiu, levou as mãos timidamente ate as costas de Vic. Não podia ver o rosto dela, apenas os cabelos sedosos da garota e as mechas que tocavam seus ombros. Aquele perfume era realmente muito bom, e pensar que ela ficou com medo de não senti-lo nunca mais. Aquele calor, aquela pele alva e macia, aquela voz que sussurrava ao pé do seu ouvido...

-Não me dá mais um susto desses ok? – parecia séria – Senão eu mesma te mato.

-Tá... – Elisha ficou sem ter o que falar. Achava que Victoria não sentia nada de demais por ela, mas aquilo... Quis acreditar que ela a amava, quis ser ingênua e parar com aquela sua paranóia mais uma vez. Sentia-se bem, como se pudesse voar.

-Agora que eu vi que você ta bem, vou ter que ir. Mas eu volto.

-Vai atrás dele? – Foi fácil deduzir, não gostou disso.

-Uhum... Agora é mais que pessoal.

-Não seja idiota, não tem como você matar ele. Nem sabe onde ele ta...

-Boba, não me subestime. – Piscou pra ela – Ele é bem treinado, mas nenhum humano consegue se esquivar de balas fora da matrix. – A garota de cabelos curtos soltou ela, se afastou um pouco e levou as mão até a sua nuca e tirou a gargantilha. Então voltou a se aproximar, quase colando o rosto de Elisha no peito, para colocar a gargantilha nela. A visão tão próxima do busto de Vic fez Elisha corar e ficar desajeitada. Achou que aquilo foi proposital – Fica com a minha, a sua já era mesmo.

Pareceu um presente de despedida, definitivamente ela não gostou. Victoria deu um beijo doce na sua testa e saiu da cama, sem antes mandar um beijinho malicioso pra garota a distancia.
Emily se levantou e foi se aproximando na medida em que Vic se afastava, ao se cruzarem a morena mostro a língua pra professora que ficou sem reação. Aqueles olhos verdes de fato eram terríveis.

-Victoria... Sobre aquilo do celular, só vou te falar quando você voltar. – Elisha quebrou aquele clima, não conseguiu se calar – Então não demora, senão eu mudo de idéia.

-Ok. – A filha de Anita Sullivan também não olhava pra trás, apenas rumou pra saída sem hesitar, seguida pelo olhar impressionado de Emily.

-Pode ir resolver seus problemas, eu cuido dela. – Embora a professora tivesse percebido o clima entre elas, não imaginava a gravidade desses “problemas”. E nem tinha ouvido a conversa pra ter uma idéia.

A gata chiou pra Victoria assim que esta passou por ela, só quando a garota saiu de lá a professora se sentou onde ela estava na cama de Elisha, deixou uma lata de refrigerante aberta no criado-mudo ao lado dos remédios e do copo d’água, começou a observar a sua aluna e falou num tom calmo.

-Tem remédio pra dormir caso você queira ali.

-Isso é sedativo... – A garota pegou algumas das pastilhas e analisou a caixa, achando isso bem estranho.

-Devem ter errado o medicamento. – Emily a tocou de leve no joelho, se demonstrando séria – Elisha, sobre seu pai...

-Não tem problema, eu to bem. – Não queria ouvir discursos de consolo, ela não estava bem com essa noticia, mas também não estava mal. Continuava fria com isso.

-Se você diz... O que eu queria dizer é que agora você esta sem responsáveis e sem onde ficar. Ainda é muito jovem pra se cuidar sozinha. Bem, o ponto é que eu iria ficar feliz se você aceitasse morar na minha casa, comigo, pelo menos por um tempo.

-Hm... – Ela já esperava isso vindo da mulher de cabelos castanhos, não iria deixa-la ficar por conta própria – Acho que não tenho muita escolha. – A morena levou a mão dos remédios discretamente até a lata de refrigerante, mas foi repreendida pela outra.

-Ah não, esse é meu, Elisha. O medico disse que é melhor você tomar só agua.

-Que saco... – Entregou a lata pra Emily, não gostava mesmo de refrigerante de maçã.

-Sabe, eu não encaro com negativismo. – Pegou e ergueu a lata na altura dos lábios, Elisha observou atenta – É incrível você tem sobrevivido sem ferimentos graves, um milagre. – Então começou a dar uma golada demorada no liquido.

-Parece que levei uma surra. – O corpo dela estava todo dolorido, mal se movimentava.

-É, também estou ficando cansada. – Emily terminou o refrigerante e estava um tanto sonolenta. Elisha parou de prestar atenção e sentou-se na beirada da cama.

-Acho que vou aceitar sua proposta sim. – Olhou pra Emily que estava tonta – Isso se eu voltar viva de lá...

-Elisha... Você... – A professora percebeu tarde demais que a garota tinha colocado algumas pastilhas de sedativo na lata, estava quase apagando.

-Me desculpa, mas você não ia me deixar sair. Liga pra policia assim que acordar. – A professora derrubou a lata e começou a sentir a gravidade aumentar – Você não deve dormir muito, a dose foi baixa... Eu estou indo visitar o Kasuya Ishida, nas florestas.

Emily caiu antes que ela terminasse a frase, Elisha não demorou então, tirou os sapatos calças jeans e o casaco dela. As calças ficaram largas nos quadris, mas o resto serviu perfeitamente. Nunca iria conseguir sair de lá usando aquelas roupas de enfermo, até a calcinha que o hospital tinha fornecido era incomoda, o tecido era áspero demais. Vestiu-se com o casaco e saiu.
Não foi difícil sair do hospital, aquele cheiro desagradável ajudou a ir mais rápido, mesmo andando com dificuldade e se esforçando pra não cair. As dobras das suas coxas e outras articulações doíam demais e o frio fazia piorar, murmurou pra si mesma:

-Eu nunca vou chegar lá assim... – Irene não respondia e nem dava sinais de estar ouvindo, desde que ela acordou – Meu corpo tá ferrado e ela foi de carro... – Victoria... Não podia correr o risco de perdê-la de novo. Não sabia o que fazer, mas precisava chegar lá. Não sabia como ia fazer pra impedir Vic e Kasuya de se matarem, pra ser sincera estava pouco ligando pra o que acontecesse com Kasuya, só queria que Victoria ficasse bem no final. Achava que se conseguisse chegar lá iria conseguir garantir isso – Droga...

Ela tropeçou nas próprias pernas e quase caiu, uma moto não atingiu ela por pouco e para sua surpresa o cara que estava pilotando parou e ficou a encará-la, pelo estilo “motoqueiro” ele parecia ser durão.

-Sayonomi? – Ele tirou o capacete – Que diabo você tá fazendo aqui? – Era o James Redriver, alto, cabelo ralo, forte, olhos azuis e irmão de Amanda – Fiquei sabendo que tua casa explodiu, devia estar no hospital, e em pedaços!

-Eu... – As noticias corriam rápido mesmo naquela cidade. Não quis pensar numa mentira, foi seca e direta – Preciso ir pras florestas, parte norte. Não posso te falar porque e espero que você não tente me impedir.

-É tão importante assim? – Ele riu da cara de Elisha, como se ela fosse ameaça... Não seria nem se estivesse em perfeitas condições. Mas ela parecia estar determinada.

-Você nem imagina. – Elisha sabia que ele tinha tendências a se tornar um criminoso, mas não se deixou intimidar pela aparência.

-Então coloca isso. – Jogou o capacete preto com desenhos de fogo pra ela, quase não conseguiu segurar – Eu te levo lá.

-Quê? – Ela hesitou, não esperava essa vinda dele.

-Se quiser ir a pé, problema seu. Só vai terminar de se foder toda.

Elisha não precisou ouvir mais nada, uns minutos depois eles estavam a 130 por hora atravessando a cidade a caminho da floresta, aquela velocidade deixava a morena insegura e o grandalhão comunicativo.

- O Jin tava me enchendo o saco pra ficar esperto com você e o Ishida. Eu nem esquentei, mas agora to vendo que o negocio tá feio. – Mal ouvia-se a voz de James, o ar que acertava o rosto dele abafava sua voz grossa.

-Você sabia que a casa dele é na floresta? – Isso escapou.

-Cê não tem cara de ir pescar essas horas. – Ela havia entregado aonde ia – E agora acaba de confirmar que tem um rolo e tá indo na casa do esquisitão resolver essa treta.

-Tanto faz... – Não tirava as mãos dos apoios – E você não tem cara de ajudar os outros.

-Sabe por que eu fui pro reformatório, Sayonomi? – Ele berrava, só assim ela ouviria.

-Não. – A morena também respondia quase gritando, não esperou por isso também.

-Eu sempre fui do tipo “irmão protetor” e a Amanda era um guria legal e esperta, até que começou a andar com a Megumi e a galera dela. Começou a desandar, por mim tanto fazia, até que um dia um cara quis fazer graça e veio me dizer que comeu minha irmã, na frente dos meus amigos. Amanda disse que era mentira, que nem conhecia o cara, e ela tinha 14 só. Nem imaginei que fosse tão perdida pra fazer sacanagem nessa idade. Eu acreditei nela e quebrei a cara do moleque, pra ele parar de falar bosta por ai. Só que a bichinha contou pros pais que eram ricos, resultado: joguei um ano da minha vida inteira no lixo por causa daquela porra de prisãozinha pra menores. E quando sai olha a ironia, descobri que minha irmãzinha querida tinha mesmo trepado com aquele Mané antes e depois de eu ter ido pro reformatório. E ainda se gabava por eu ter amassado o focinho daquele filho da puta. – Elisha não se surpreendeu, conhecia Amanda bem melhor que o próprio irmão dela – Homem não presta mesmo, mas mulher é um bicho bem mais traiçoeiro, não dá pra confiar em vocês. Amanda não vale nenhum centavo, mas eu ainda ligo pra ela. E se eu to ajudando você também, mesmo sabendo como mulher é, eu sou burro no mínimo. Com isso minha cara combina um pouco.

-Melhor eu ficar quieta. – Achou o comentário machista e que James não era mesmo dos mais inteligentes, mas ele tinha motivos. Foi bom ouvir aquilo.

-Se eu soubesse ia ter ido pra lá por bater na Amanda, ia me arrepender bem menos.

-Ia ser engraçado. – Elisha riu baixo, sentiu algumas dores por isso, mas ia ser ótimo Amanda ter apanhado do irmão. Principalmente se a surra deixasse alguma marca.

Chegaram à floresta alguns minutos depois.

-Já disse que não precisa ir comigo.

James tinha mesmo ido com ela pra dentro do lugar, estavam perto.

-Nem quero aturar o Jin jogando a culpa em mim se acontecer alguma coisa com você.

-Pra que a faca? – Era uma de exercito, o garoto ia servir o serviço militar no ano que vem, parecia ter entendido a situação de Elisha. Ela desistiu de pedir pra ele voltar.

-Sou o mau exemplo da sala esqueceu?

Chegaram em frente aquela mini-mansão oriental onde Elisha esteve antes, a casa de Kasuya e Erin. James ficou impressionado, nunca imaginou que a floresta escondesse um lugar daqueles, e que um dos seus colegas de classe morasse lá.

-Dá pra me resumir a historia pelo menos?

-Lembra da Victoria? – A garota achou injusto não contar – Ela quer matar o Kasuya e não duvido que seja mutuo o sentimento.

-Isso não vai acabar bem.

Eles olharam ao redor, tudo estava aberto. Vic já devia estar lá ou Kasuya estaria os esperando... Só tinha um jeito de descobrir.
Rondaram a casa até acharem uma sala enorme, lembrava um templo japonês, chão de madeira negra extremamente polida, pilastras e onde estaria um altar, um suporte com duas espadas orientais, deviam ser ornamentais. Estava muito escuro, a única iluminação se resumia em velas e lampiões pendurados por ai, mas foi o suficiente pra enxergar uma garota no chão, soluçando e trajando um vestido claro em frente o suporte. Não era Victoria, aqueles cabelos prateados eram inconfundíveis, Erin.
Elisha não se moveu, foi James quem se apressou pra ela. Ele estava enxergando Erin? Era obvio que sim, a morena ficou confusa. Ele não via a garota na escola, como estava vendo agora? Aquilo não fazia sentido.
Porem antes de James chegar perto de Erin, uma voz tomou a atenção que os dois “visitantes” dedicavam a garota ajoelhada no chão.

-Me surpreendeu duas vezes agora, Elisha Sayonomi. – Aquela voz, só podia ser ele. Estava de braços cruzados encarando ambos, no meio da escuridão – Não achei que você se escondia atrás de homens, e nem imaginei ver você viva de novo. – Isso deixou claro que fora mesmo ele quem armou aquele “acidente” pra ela. Aquele mesmo garoto de cabelos prateados que caminhou calmamente até a frente de Erin, então ele era o vilão. – Você é mais incomum do que pensei.

-Deixa isso comigo. – James sussurrou pra morena, tomando a frente.

-Eu sugiro que vocês saiam daqui. Meu assunto não é com nenhum dos dois. – Kasuya era calado, mas até que tinha uma bela voz, Elisha gostava. Pena que sempre era em tom de ameaça quando dirigida pra ela.

-Pára de graça Ishida, eu to sabendo qual é a sua e não vai sair morte aqui! Você não vai encostar nessas meninas. – James era mais agressivo e estava armado com aquela faca – Nem que eu precise te arrebentar todo pra isso. – Kasuya soltou um “tsc” arrogante.

-Você não sabe de nada, e nem ela. Esse mundo se resume em morte... – Seus olhos avermelhados fixaram-se em James – Se você quer tanto a sua, então venha encontrá-la.

O ar de superioridade de Kasuya irritou James, falava como se fosse um deus perto do rapaz. E foi o que pareceu.
Kasuya desviou da facada que James tentou acertar facilmente, tomou a arma das suas mãos e ainda acertou o pé nos calcanhares dele fazendo-o cair no chão de tão mau jeito por cima do braço que Elisha pode ouvir o som do braço direito dele se despedaçando. Só tinha visto cenas de briga assim por vídeos na internet, agora sim ela acreditou que os seres humanos eram mesmo muito frágeis perto de monstros como aquele menino de cabelos albinos. James se levantou e tornou a avançar sobre Kasuya, urrando de raiva ou talvez de dor. O outro se esquivou de lado do soco facilmente e cravou a faca do próprio James no pescoço deste. Havia acabado. Elisha ficou sem reação diante daquilo, nunca tinha presenciado cenas desse porte. Kasuya passou pelo corpo do rapaz que já havia tombado como se não fosse nada.
Ele tinha esmagado o cara mais temido do colégio Dark River como um inseto. A morena imaginou se todos os membros da tal Black Rose eram monstruosos assim, foi na direção dela que Kasuya veio, ainda segurando a faca cheia de sangue.

-Eu disse que meus assuntos não eram com você Elisha Sayonomi, mas agora que você está aqui... – A garota não sabia o que fazer Irene não estava aparecendo pra salvá-la agora – Acho que tenho um uso pra você.

Outra voz irrompeu no local, dessa vez ainda mais agradável aos ouvidos dela:

-Começaram a festa sem mim? Que mal educados. – Não era nenhum cavaleiro salvador com armadura brilhante. Era Victoria, trajando aquela roupa que Elisha gostou, bem melhor. Ou bem pior. – Tava apertada, daí parei pra fazer xixi no caminho.

Estava vindo pra eles com as mãos atrás dos quadris e um sorriso no rosto. Elisha não soube o que pensar ou fazer, se olhava pra Victoria ou Kasuya.

-Não sei o que Anita te deu pra matar Yuna, Kasu-chan, mas eu trouxe um presentinho pra retribuir. – Outra coisa que Vic não disse, que sabia que foi Kasuya. Somando isso com o fato dos Ishida serem membros da Black Rose, Victoria já devia saber desde que Elisha mencionou Kasuya Ishida pra ela. Por que Vic não contou? – Só tem 12 balas então fica parado pra eu poder acertar todas ok?

Ela ergueu uma pistola de porte médio, negra, e disparou três vezes, Kasuya não ficou parado e Elisha viu que não era pra Vic que ele estava olhando, era pra ela. Os tiros não o acertaram, e Elisha só notou o quanto ele estava perto quando sentiu suas mãos ásperas puxaram-lhe pela blusa e a lâmina fria da faca com sangue de James tocou sua garganta. Victoria a olhou com uma expressão de desapontamento, parecia que só notou Elisha ali agora.

-Quanta teimosia... Eu disse pra ficar no hospital. - Porem ela não disse mais que isso e voltou a atenção e a pistola para o garoto – Me diz Kasu-chan, fez tudo isso só pra ressuscitar sua irmã, pra ter ela de volta?

-Talvez. Solte a arma Victoria Sullivan – Ele não olhava pra Vic de jeito algum, seus olhos focalizavam os ombros de Elisha que estava silenciosa olhando pra Victoria – Não me obrigue a matar ela também.

-Você acha que eu me importo? Já sei que não foi ela que Anita usou, só queria que ela me trouxesse até você. Eu nem sabia chegar aqui. – Aquilo doeu. Mesmo sendo um blefe talvez, doeu. Como se tivesse atirado direto no peito de Elisha – Você tem sido a única pessoa na minha mente há um tempinho, fofo. E agora que te achei, não tenho mais utilidade pra ela, de uma forma ou de outra você vai sair daqui cheio de buraquinhos.

Elisha olhou pro chão de madeira, então foi Vic que deixou o sedativo lá. Ela sabia que Elisha ia fugir correndo de lá pra salvá-la. Tinha usado ela, talvez estivesse usando desde o inicio. Irene não estava falando nada, a garota se sentiu sozinha, como era antes. Subitamente o dialogo foi interrompido, um impacto nas costas derrubou a morena, que caiu no chão sem ser degolada, só sentiu uma dor terrível no joelho.

-Parem com isso, por favor! – Era Erin, ela tinha se atirado no braço de Kasuya, fazendo Elisha se desequilibrar e cair, ficando agarrada no braço do garoto de cabelos brancos. Ela estava diferente, havia algo a mais nos olhos vazios dela, como se tivessem ganhado vida.

Vic não hesitou, Erin impedia Kasuya de se mexer. O disparo atingiu o ombro do rapaz, ele cerrou os dentes, mas não caiu.

-Pára Victoria! – Erin gritou desesperada para a garota de olhos verdes, se colocando na frente de Kasuya, Victoria parou de sorrir, mas não abaixou a arma. Elisha reconheceu aquela expressão, aquele olhar frio, assustador, psicótico. O clima ali ficou três vezes mais pesado e frio. Erin fechou os olhos e chorou.

-Não sei onde você ouviu meu nome, mas é melhor sair daí. - A voz era impassiva.

-Não! – Erin parecia terrivelmente assustada, chorava e tremia toda, mas mesmo assim não se moveu – Por favor, Victoria! Ele não fez isso por mal, ele só queria...

-Por quê? Depois de tudo que eu te fiz... – Quem interrompeu foi Kasuya, ele estava estancando com a mão o sangue do ombro baleado, olhando para as costas daquela garota que o defendia.

-Vocês estão enfrentando a mesma dor... – Respondeu Erin hesitante e tremula – Não precisa ser desse jeito!

-Ah... Cala boca. – Kasuya ficou em silencio, a frase veio de Vic.

O disparo foi contra Erin dessa vez, ela fechou os olhos com o barulho, esperou, mas a dor não veio. Abriu os olhos lentamente e as lagrimas vieram em dobro quando enxergou Kasuya de frente pra ela, a observando. Tinha se colocado na frente da bala.

-Por que...

-Você não é ela, mas me lembra o jeito que ela falava... – A expressão dele continua fria e a voz calma, mesmo depois de dois tiros – Ela era gentil e ingênua, como você é...

-Kasuya... – Erin estava perplexa, aquilo a pegou de surpresa.

-Sua memória deve voltar com o tempo. – Ele se ergueu um pouco – Você deve viver, Erin... Não precisa assistir isso.

Erin perdeu o ar e a consciência com o soco que levou na barriga, Kasuya a empurrou pra longe dali e Vic não esperou mais, acertou a perna dele, fazendo-o ajoelhar.

-Quem diria... – Outro tiro na mesma perna, mais abaixo – Você bancando o cara legal. – O segundo foi no braço que ele estava segurando a faca, ela caiu e Vic chutou pra longe – Qual é a sua, hein Kasu-chan? – O outro foi na perna que estava intacta – Titio Tetsuo não te ensinou boas maneiras? Tipo não quebrar brinquedos dos outros? – Esse foi no abdômen, quando Vic já tinha dado a volta pra ficar de frente com ele, Kasuya ainda fitava o chão, como se olhar pra Victoria, pros olhos dela fosse o fim. Quieto, calmo e frio mesmo depois de tantos ferimentos.

Devia estar atordoado de dor, mas mesmo assim se recusava a responder. O silencio e sua resistência aos disparos incomodava Victoria cada vez mais.

-Yuna era minha pessoa preferida. – Ela se agachou de frente pra Kasuya, erguendo a arma pra cabeça dele – O que Anita te deu pra matar ela? Devolveu sua irmã? Se for você vai me contar como, porque eu quero Yuna de volta!

A voz, o olhar, aquela garota não parecia um anjo como sua aparência dizia, não naquele momento. Talvez Kasuya não respondesse por medo. Aquele efeito inexplicável e aterrador que o olhar das Sullivan tinha.
Elisha tinha engatinhado até Erin e ficou perto da garota inconsciente, estava respirando pesado, pior que aquela menina, de forma tremula. A pancada que ela tinha levado tinha sido muito pior e dolorosa, seus pensamentos tinham chegado a uma conclusão: Victoria amava Yuna. Ela mesma não significava nada para a dona daqueles impiedosos olhos verdes. A dor no peito era indescritível e a expressão no seu olhar indecifrável.

-Idiota... – Irene, Elisha ouviu a voz dela finalmente, era um conforto no meio daquela turbulência emocional no seu coração. Irene, a única que ela podia confiar, a única que a guiava, a sua única amiga de verdade, sua única protetora.

Ela se sentiu ótima ao ouvir aquele “Idiota!” ecoando na sua cabeça, ficando cada vez mais estrondoso. Talvez um fruto da sua loucura, ela não ligava.
Victoria sorriu e continuou sua pequena tortura.

-Se é assim o próximo vai ser num lugar “precioso” pra todo homem.

Vic cometeu um erro, abaixou a arma tirando ela da direção de pontos vitais e estava muito perto, o suficiente pra Kasuya atingir a mão dela fazendo-a derrubar a pistola e agarrar o pescoço da garota com a outra mão. Mesmo com um só braço e atingido por uma bala, Vic não teve forças pra tirar aquela mão de seu pescoço. O ar se esvaiu dos seus pulmões e os dedos esmagavam o pescoço lentamente. Só então o garoto de cabelos claros falou:

-Se eu não olhar nos seus olhos... E nem ouvir sua voz... Seus feitiços não vão mais funcionar em mim, bruxa maldita!

Vic não pode responder, estava se engasgando, seu corpo perdeu as forças e ela quase desmaiava. A pistola deslizou no chão e foi Elisha quem a apanhou. Destino?
Lá estava ela com a vida de Victoria nas mãos. Ficou observando Kasuya apertar o pescoço dela cada vez mais forte, de onde ele tirou forças depois de levar sete tiros?
Elisha estava hesitante até Irene perguntar:

-Vai deixar ela morrer? – Pensou um pouco e decidiu o que ia fazer.

-Por que eu ainda quero defender ela?

-Idiota. – A resposta foi rápida e cruel.

Ela disparou sem jeito, mas acertou o braço de Kasuya e assim que ele soltou, Vic mesma juntou forças pra chutar o peito dele com a sola da bota, afastando-se tossindo. O rapaz olhou pra Elisha com seus olhos quase vermelhos.

-Me surpreendeu de novo Elisha Sayonomi. Não achei que você fosse tão limitada.

A voz dele soava um tanto cansada e danificada, pelo menos aquele cara não era indestrutível, mas parecia estar com a razão.

-Você tem certeza que está do lado certo? Acha mesmo que ela é a mocinha?

-Cala a boca... – Uma parte de Elisha não queria ouvir aquilo.

-Ela esteve obcecada por Yuna Kayoshi e fez de tudo pra achar os culpados pela morte dela. – Vic ainda estava sem ar, não conseguia falar e Elisha simplesmente não quis falar. Ficou cabisbaixa apontando a arma pra ele – Foi ela que te contou sobre a Black Rose? Disse que sabia que poderia ser eu desde que veio à Sleepy Hill? – Ele fez uma pausa e ela continuou calada, a resposta era não – Você também pode ouvir não é? As vozes... O demônio dentro de você que te induz a fazer coisas, que sussura no seu ouvido. Ela te contou que sabia que nós dois ouvíamos essas vozes? Que assim como eu você também era suspeita por causa disso? – Elisha parecia saber que Kasuya ouvia algo parecido com Irene, mas usava o termo “demônio” enquanto ela preferia “dupla personalidade”. Era inegável a sensação familiar que ele causava nela, ela parecia entender o que havia por trás daqueles olhos frios do garoto, como se no fundo o entendesse e vice-versa – Te contou que aquele livro que eu achei na sua mesa era uma copia da profana Chave de Salomão? Que ela furtou de Anita Sullivan. Não me impressionei de ter encontrado aquilo na sua casa, por causa das vozes nós podemos senti-lo, foi fácil saber onde era sua casa por causa dele. Acha que ela te deu aquilo por acaso? Ela te usou desde que apareceu aqui, só pra me pegar. Sabia que eu ia estar esperando aqui agora e mandou você na frente como isca, sabia que se eu tentasse te eliminar era por que você estava achando provas contra mim e então eu seria o culpado. Ela sabia de tudo. – Os olhares dos dois jovens se encontraram por alguns segundos, Kasuya não estava mentindo – Encare os fatos Elisha Sayonomi, um demônio como ela nunca iria se importar com alguém como você. Abra seus olhos, está apontando a arma pra pessoa errada.

Os olhos amarelados pareciam brilhar ao encararem os avermelhados que emitiam o mesmo brilho natural, abaixou a pistola. No fim seus temores se tornaram reais, Vic tinha a feito dançar como um boneco, puxando suas cordinhas. Ela se sentiu como se fosse assassinada brutalmente cem vezes em consecutivas em apenas dois segundos, foi a voz de Irene que a ressuscitou. Sentiu a “voz”, seu “outro eu”, seu “demônio” mais perto e dentro dela que antes, não sentia mais nada. Era como se ela e Irene agora fossem uma só, como se Irene, ela mesma, fosse tudo que tivesse. A única que ninguém nunca iria afastar dela, a única em que ela pudesse realmente confiar.

-Atira Elisha... – Vic recuperou a voz.

-Isso tudo é verdade? – Precisava ouvir isso da boca dela.

-Não é hora pra isso agora, ok? Depois eu vou te contar tudo... – Era isso que Elisha queria ouvir. Um efeito interno destruidor, mas bastou.

-Some daqui. – Isso foi pra Kasuya, que sorriu de canto e se levantou esforçadamente.

-Elisha, atira... – Victoria foi interrompida por um tiro sim, mas esse por pouco não acertou seu próprio rosto, encarou Elisha – O que você...

-Foi mal, acabou a munição. – Aquele ar irônico servia pra esconder a dor que estava sentindo. Até que funcionava bem.

-O que você tá fazendo?- Vic falava normalmente agora, sem psicose ou aquele efeito estranho que causava, como se não tivesse feito nada errado.

-Eu errei. – Mentiu de novo – Vai embora logo Ishida, antes que eu resolva retribuir a explosão.

– Ela largou a pistola, estava vazia agora.

Kasuya tinha parado pra observar, mas achou melhor sair dali, senão não iria muito longe naquele estado. Saiu, lentamente e mancando. Era incrível o ver andando depois daquilo, sem duvidas aquele homem era mesmo um monstro.
Ele desapareceu na escuridão, mas o cheiro de pólvora e sangue ficou. Teve a impressão de ver Erin ir embora com ele igual na escola. Mas ela estava ali no chão, desacordada, devia ter delirado. Vic então se recuperou a ponto de poder se levantar.

-Que ótimo... Espero que você esteja feliz. Por causa dessas suas crises bestas estragou tudo! Quero ver como a gente vai achar ele de novo. – Falava como se tudo aquilo fosse normal. Tiros, morte, sangue, traição... Em que mundo ela tinha sido criada afinal? Talvez nesse mesmo, por aqueles dos piores – Se a irmã dele está ali viva, então a gente pode trazer a Yuna de volta também...

-Você fala tanto da Yuna, mas acha que é isso que ela ia querer? – Elisha encarou Victoria ainda se sentindo um lixo barato – Que você saísse por ai usando e matando os outros só pra vingar ou tentar trazer ela de volta? Você conhecia ela a muito mais tempo e melhor que eu, e ainda não sabe nada sobre ela! Yuna era boazinha! – Elisha se alterou – E por que diabos você diz “a gente”? Você nem consegue negar que eu fui um peão no seu joguinho idiota! Acho que se você mentisse, me enganasse de novo, eu ia ficar bem melhor! Se você quer jogar sozinha, ótimo. Só pára com esse “nós” porque eu tô fora!

Elisha deu as costas pra Victoria e estava indo até Erin, mas parou quando ouviu Vic dizer num tom diferente, parecia demonstrar comoção.

-Me diz que não seria perfeito... – Parecia uma criança triste e indefesa – Nós três juntas, livres. Viajando por esse mundo todo sem Anita, sem seu pai ou outros adultos... Eu sei que é o que você mais quer Elisha. Ter alguém, ser feliz e independente...

Aquilo atingiu a morena, bem fundo. Odiou Vic por ter dito isso, porque realmente ela adorava fantasiar, sonhar em como seria isso... Estar junto com Victoria e Yuna, rir quando Vic constrangesse Yuna; consolar Yuna quando ela chorasse; se deixar levar por aqueles beijos de Victoria... Tudo isso não passava de um sonho, ela queria acordar. Ninguém ia salvá-la daquela sua vida, não existiam cavaleiros em armaduras brilhantes, ilusões eram perda de tempo. Yuna morreu e Victoria... A reação foi violenta, Elisha gritou, virando-se pra ela.

-Ela morreu Victoria! E nem você e nem ninguém pode mudar isso! Pára de ser infantil e acorda!

Vic continuou ali inabalável, como se nada que Elisha disse ou fez fizesse efeito. Seu coração parecia intocável e sua teimosia indestrutível, estava calma e séria, seus olhos encontraram os de Elisha que ficou sem palavras, foi ela quem falou:

-Vem comigo Elisha... Nós vamos dar um jeito. Agora que você não tem família e nem nada que te prenda aqui, não tem mais nada a perder, nós podemos sair daqui juntas. Eu sei que vou conseguir trazer Yuna de volta, eu posso fazer seu sonho se tornar real. Mas não vai ser a mesma coisa sem você nele.

Aqueles olhos verdes e aquela expressão no rosto de Victoria faziam Elisha querer acreditar, queria correr até ela e a abraçar, jogar toda sua vida pro alto e sumir com aquela garota. Um sonho distante...
Sonhos sempre acabam uma hora, não se pode sonhar pra sempre, talvez só se você estiver morto. Elisha virou de costas pra não ficar sob aquele olhar e disse a frase mais difícil de toda a sua vida:

-Vai embora Victoria... Some da minha vida.

Depois de tudo aquele seu orgulho besta não a deixava perdoar Victoria, sua raiva e tristeza quase a derrubavam de tanta dor e só então o coração da outra garota pareceu ter sido tocado, sua voz saiu baixa:

-É isso mesmo que você quer?

-É! Vai embora. – Outra mentira, mesmo com a voz agressiva ela se corroia por dentro.

-Tudo bem... – Foram as ultimas palavras de Vic, ela deu um passo pra frente. Talvez tivesse pensado em se despedir sem usar palavras, mas desistiu. Foi rumo a saída, hesitante, e sumiu.

Poucos minutos depois foi Elisha quem se virou discretamente desejando que ela estivesse lá ainda, mas Vic tinha mesmo ido embora sem olhar pra trás.
Saiu de sua vida como ela mesma mandou, desistiu dela como todos naquele mundo faziam, era até irônico, ninguém a levava a serio. Era apenas uma anti-social problemática. Quando finalmente tinha acontecido acabou assim. Por que tinha que acabar assim afinal?
Ela não tinha mais nada, mais ninguém... Emily? Ela era legal com todos. Yuna? Morta. Jin? O que ele sabia. Luise? Nunca tinha tempo pra ela. Morrigan? Era um animal egoísta. Elisha tinha vivido sem nada por tantos anos, mas agora viver sem um motivo tinha se tornado tão ruim, tão frustrante.
Sua dor então a derrubou, ela seu viu de joelhos com as mãos apoiadas na madeira. Sentiu aquela sensação que não sentia desde que era criança, uma chuva de lagrimas prontas pra lhe escaparem pelos olhos, contrações na face, olhos lacrimejando.
Então isso era o amor? Estava certa sobre isso também.

-Deixa elas caírem, vai se sentir melhor. – A voz ingênua veio de Erin que estava agachada do seu lado. Nem percebeu que ela tinha acordado e muito menos que estava tão perto.

-Do que você tá falando? Eu não estou chorando... – Esfregou os olhos com as mangas.

-Mas você ia.

-Cala a boca. – Erin ficou quieta por alguns segundos e depois perguntou algo.

-O que aconteceu aqui? – Essa era a Erin “normal”.

Antes de responder ela viu uma movimentação, era James. Elisha correu pra onde ele estava deitado e viu uma mensagem escrita em sangue ao seu lado.
“Fala pra Amanda criar juízo. Você tava certa, gente do meu tipo morre primeiro...”
Mal conseguiu ler aquilo, ele já estava morto agora. Não conseguiu falar nada por causa do corte na garganta, Elisha murmurou um “Obrigada, e me desculpe... Morrer não é tão ruim.” pra ele. Sua expressão mostrava tranqüilidade apesar daquela morte violenta.
A policia chegou quase meia hora depois, Erin e Elisha foram levadas pra interrogatório, a tal irmã de Kasuya tinha perdido a memória misteriosamente e Elisha contou quase tudo o que houve de verdade, omitindo só o que poderia incriminar Victoria, ou seja, a presença dela nesse caso. Kasuya agora passou a ser foragido e ela voltou pro hospital pra se recuperar, ficou lá alguns poucos dias.
Por alguma razão ela ficou com a gargantilha de Vic. Por mais que ela quisesse esquecer, achava que algumas lembranças eram boas de recordar.
Depois desse meio tempo lá estava ela, a Elisha Sayonomi de antes. Sua rotina mudou um pouco. Estava com Emily no departamento de policia, esperando Erin ser liberada.

-Tem certeza? – Murmurou a morena desinteressada.

-Essa menina não tem pra onde ir.

-Você vai abrir um orfanato assim.

-Eu sinto algo familiar nela. – Sorriu pra Elisha, estava até feliz com aquilo – E vai ser divertido cuidar de vocês duas.

-Se isso quer dizer que você vai fazer todo trabalho domestico...

Erin então saiu da sala acompanhada por um policial, estava liberada finalmente. Emily até tinha cuidado dos papeis para poder ficar com a garota por um tempo sem problemas. E ela estava tímida, com as mãos cruzadas em frente as pernas.

-A mocinha vai ficar com a gente. – Emily se adiantou pra ela, sorrindo simpática – Qual seu nome mesmo?

-Erin... Erin Nayami. – Respondeu a menina de cabelos albinos pausadamente.

A professora se assustou ao lembrar do que Elisha disse no Halloween, aquele nome realmente iria se encaixar no numero oito, sabia a chamada de cor. Virou-se pra Elisha que confirmou, gostando daquela expressão de espanto da mulher.

-Sim, essa é a Erin Nayami de quem eu te falei.

Mais tarde elas estavam no carro compacto cor de prata de Emily, indo pro novo “lar”. Para Elisha, a professora estava tentando substituir suas filhas desaparecidas por elas, afinal, deviam ter dezessete também. Um treinamento pra caso as achasse?
Não protestou, queria deixar Emily sonhar um pouco. Sempre que pensava em sonhos lembrava-se do seu, Victoria. Acabava por ficar quieta e com uma feição estranha.

-Elisha, você parece triste. – Viu os olhos de Erin, mesmo sem sentimentos pareciam demonstrar-se curiosos.

-É impressão sua... – Estava se tornando um hábito esconder o que sentia.

-Vou deixar vocês lá em casa, tem comida pra fazer caso queiram, é só dar uma procurada que vocês acham de tudo. Eu vou ter que passar em uns lugares.

E foi exatamente isso que Emily fez.
Ficar naquela casa desconhecida com Erin foi divertido, Morrigan também estava lá, mas nada notável. Continuava sem graça. Mas a menina de cabelos prateados era engraçada aos olhos da morena, primeiro tentaram fazer janta e Elisha queimava tudo que fazia. Tinha fumaça pela cozinha toda.

-Você é péssima cozinheira Elisha. – Erin ficava atrás dela, observando e opinando no que ela fazia. Estava com uma mão nos lábios segurando a risada.

-Valeu pela sinceridade. – “A comida que a pessoa faz reflete sua personalidade.”, lembrar desse ditado que ouviu fazia Elisha ficar descontente – Quer tentar?

Erin aceitou o desafio, tinha perdido a memória, então ia acabar explodindo a cozinha como seu irmão fez. E ela venceu, Elisha ficou ainda mais descontente quando provou.

-Não está bom?

-Esse é o problema, tá bom demais.

Depois da janta ela ficou tentada em ligar aquele PC na sala de Emily, que era bem melhor que o seu. Faziam dias que estava sem internet, o vicio falou mais alto e Elisha acabou ligando. Erin quis tomar banho.

-Como eu faço?

-Nem brinca que eu vou ter que te ensinar a se lavar... – Ainda no PC.

-N-não, é que não tenho toalha.

-Usa o que tiver lá mesmo.

E ela foi. Quinze minutos depois estava de toalha do lado de Elisha, confusa e molhada.

-Elisha, e as roupas?

-Pega algumas da Emily. – A morena não resistiu e deu uma breve olhada pra Erin enrolada naquela toalha, a garota corou e correu pro quarto. Um tempinho depois ela voltou de novo, desesperada, Elisha não soube por que isso repentinamente até ouvir a voz chorosa de Erin:

-Elisha, as blusas ficaram muito largas no busto! E agora??

Ela riu, de forma discreta, mas divertida. Era obvio que ficaram, mesmo só notando quando olhou pro busto de Erin. Emily tinha medidas avantajadas, já Erin parecia uma tábua. Não riu por isso, riu pela expressão e o drama que a menina albina fez, era tão humilhante assim ter um corpo esguio?

Emily não chegou tarde, estava cheia de sacolas nas mãos.

-Bem meninas, trouxe escovas, toalhas, pijamas e tenho um colchão sobrando. Amanhã vou esvaziar um cômodo que não uso e montar um quarto pra vocês. Então vai ficar desconfortável só hoje.

Elisha queria ver o quanto isso ia durar, amanha seria um dia longo e como se já não bastasse, a escola ainda não tinha acabado. Ela nem sequer ia tentar entrar numa universidade esse ano, ainda não tinha idéia de que carreira seguir. E agora que estava empregada não ligava muito pra isso.
Emily não disse nada sobre ela estar no PC e foi dormir cedo, Elisha quis aproveitar e ficar lá até o sono vir, porem Erin também ficou. Atrás dela olhando suas conversas e dando opiniões, Elisha odiava isso. Entrou naqueles sites que dão medo, imagens de aliens em particular. Ela pessoalmente se acostumou com fantasmas, mas odiava ETs.

-O que é isso Elisha? – Não funcionou, só deixou Erin curiosa.

-É o Bill Gates na forma original... – Desligou o PC e foi deitar.

Ficaram na sala, já que recusaram tanto o quarto de Emily que a professora cedeu. Elisha ficou com o sofá e Erin com o colchão, estavam lado a lado usando os pijamas improvisados pela dona da casa, a morena achou o sofá confortável, estava deitada nele folgadamente, mas algo a incomodava. Erin não dormia, ficava ali deitada de lado olhando pra ela e sorrindo.

-Elisha... – Finalmente falou.

-Quê?

-Posso falar algo?

-Fale... – Já estava falando mesmo.

-E-eu gosto de você.

-Por quê? – Ela não estranhou isso vindo do nada, só quis saber motivo.

-Não sei... – Os olhos dela novamente exibiam aquele brilho de vida, caloroso. Mas não era mais belo que o sorriso – É como se eu te conhecesse há um tempão.

Elisha suspirou e olhou pro teto, pensando em Victoria e Yuna. Naquele triangulo amoroso em que ela se meteu... Yuna se apaixonou por ela, Vic por Yuna e ela por Victoria. Que rumo as coisas iam tomar agora? O simples fato de uma garota integrante da Black Rose ter amado ela mudou bruscamente sua vida. O que devia vir a seguir?
Irene dizia que aquela não seria a ultima vez que Elisha ia ver Kasuya e Victoria.

-Quem sabe não é de outras vidas.

Erin riu timidamente ainda olhando pra ela, mas Elisha continuou perdida na sua própria mente. Irene nunca errava.

-Boa noite Elisha.

-Boa noite Erin.

2 comentários:

  1. Elisha \õ/
    Eu sabia que ela não tinha morrido. 8) -s
    Foi da hora a 'ação' e as declarações sobre os fatos.

    Não sou de perdoar uma traiçao, seja ela qual for, posso até fingir que esqueci e talz, mesmo sendo emotiva como sou, boba, ou melhor, 'estilo' Yuna. \fato
    Mas não achei que isso faria o genêro da Elisha, sei lá, até entendo o que é gostar de uma pessoa, ainda mais quando se é a única na qual ela conseguiu se importar, se abrir talz, mas não fez muito o estilo dela isso não, pra quem mostrava ser tão 'forte' e com diversos conceitos sobre as pessoas no geral, não gostei da conclusão dela no fim. Ficou parecendo uma tonta. Ainda mais diante do fato que a Victoria deixou claro, ter a Yuna de volta. Usou a Elisha o tempo todo. Fiquei com raiva das 2. [falei] '-'

    Decepção Total com a Victoria! Mó mancada. E palhaçada, ela gostava da Yuna e a Yuna da Elisha, ela não ia se sentir bem em ter que 'dividir' o amor da Yuna, ainda mais sendo obsessiva do jeito que se mostrou nos cp. anteriores. Bah!!! Ignorem, me revoltei com algumas coisas. -.-

    Mas tá legal, agora quero mais do que nunca ver o fim disso.

    D.

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