quarta-feira, 29 de julho de 2009

Capítulo XVIII - Destino

Os meses passaram rápido esse ano, quando ela notou já era quase natal. Sua vida tinha ficado agitada nesse meio tempo.
Teve que prestar serviços comunitários num asilo e odiou isso, por outro lado, gente velha tinha ótimas historias sobre aquela cidade.
Mas isso não vinha ao caso no momento, o grande assunto era o baile de formatura! A noite mais importante da vida de todo jovem. Seria mesmo?
Elisha e Erin pareciam duas bonecas depois de arrumadas, vestido preto que deixava os ombros a mostra, gargantilha e saltos; o outro branco com alguns enfeites prateados, também saltos e um colar que Emily emprestou. Os cabelos da menina de branco estavam presos.

-Estão lindas! Tente sorrir Elisha, é a ultima vez que você vai vê-los.

-Isso é positivista. – Morena com as mãos nos quadris.

-Estou ansiosa... – Albina com mãos a frente das coxas.

-É só relaxar e se divertir Erin. – A professora também estava encantadora, trajava um vestido azul claro, quase branco, com alças de pano largas que cobriam seus ombros por inteiro, os inevitáveis saltos e um colar parecido com o da garota de branco. Seus cabelos claros soltos e aqueles olhos azuis radiantes eram de roubar a cena. Ouviu-se uma buzina do lado de fora – Os rapazes chegaram, bem, eu vou indo pro meu carro. Está nervosa?

-Eu não, mas você está. –
Elisha respondeu diretamente, o estado de Emily era visível e ela sabia do motivo. Erin tinha saído tímida, mas elas ficaram trancando as coisas.

-Eu esperei tanto por esse dia... Agradeça a Luise caso eu desmaie na hora. – Sorriu tremula. A matriarca dos Kayoshi tinha descoberto quem eram as filhas dela e hoje seria o dia em que elas falariam sobre isso – Finalmente vou encontrá-las. Quando Luise ligar eu vou sair do baile voando.

-Nem vou te esperar pra dormir. Cuidado na estrada...

-E você aproveite a noite mocinha. Conseguiu um otimo...

-Ele não é meu namorado. –
Foi por costume.

-Mas eu não disse nada oras... – Emily riu, indo pro seu carro prata – Minha intuição feminina diz que essa vai ser uma noite pra se lembrar.

-A minha também. – Dessa vez foi Irene.

Os meninos fizeram os elogios e cortesias para então partirem pro baile, o carro era um vermelho esquisito, era Ryo quem dirigia, ele era o par que Jin arrumou pra Erin.
Elisha já tinha o ameaçado de morte pra ele não se empolgar. E Jin estava calado, como se fosse tímido. Ambos de ternos clássicos.
O local onde o baile ia ocorrer era demasiadamente luxuoso, onde eram realizadas apenas festas da alta sociedade. Provavelmente era um feito de Megumi Hatsuko ter conseguido aquele lugar, parecia um castelo iluminado e moderninho.
Quando desceram Erin se animou, estava fascinada com o ambiente.

-Vamos branquinha! A gente tem que começar a dançar logo pra ganhar a coroa.

-Tá. – O casal sorriu ressonante e entrou lá.

-Se abusar eu corto suas mãos hein... – Ryo nem ouviu a ameaça da morena, eles foram na frente com pressa e deixaram o outro casal no silencio, Elisha encarou Jin achando que ele estava quieto demais e como ele não falou nada, ela perguntou:

-O que você tem?

-Não achei que você ia vir.

-To cumprindo com a minha palavra.

-Você só aceitou por causa do trato?

-Que pergunta é essa agora? – Ela quase corou – Anda logo antes que eu mude de idéia.

E entrou no salão seguida por ele, já no meio das pessoas, sim estava lotado, ela viu duas pessoas conhecidas, Leon e Carrie.

-Não é que você conseguiu mesmo? Ela parece satisfeita. – Elisha achou que os dois combinavam – Só espero que ela não exploda tudo depois do baile.

-Você é boazinha. – Jin riu, mas com aquele falatório Elisha não entendeu o que ele disse, e ele negou que tinha dito algo quando ela perguntou. No meio das fotos, abraços e parentes de colegas que ela nunca tinha visto na vida, a morena ficou parada de pé, sem saber pra onde ir.

Encontraram-se com Emily na hora errada, ela fez ambos tirarem fotos juntos. Uma dos três, outra deles mais Erin e Ryo, a ultima foi somente dela e de Jin.
Depois dessa, largaram os dois sozinhos na multidão de novo.

-Deixaram essa marginal entrar? Que declínio.

Aquela foi a ultima frase que Elisha ia ouvir de Megumi Hatsuko, ela passou perto dali, estava com Bianca e ambas 100% produzidas, arrasando, como diria Kyoichi. Estavam acompanhadas por dois galanzinhos mais velhos.
A morena nem olhou muito, mas Irene fez um comentário:

-Aposto que ela tá puta. Você tá com o único que deu um pé na bunda sarada dela.

-Como se eu ligasse.

Jin a ouviu falar sozinha, mas nem comentou. Segurou a garota pela mão e a guiou para o salão de dança, mais precisamente pra uma mesinha que ele tinha alugado. Eles se sentaram, estava bem luxuosa com aquelas toalhas vermelhas e as flores na decoração, tinham varias mesinhas idênticas em torno do salão principal. Podia-se ver uns balcões no terceiro andar, já que aquele salão era no segundo, havia um palco grande a frente da “pista de dança” e a musica era lenta, do tipo melosa e clássica.
A morena aceitou uma batida de morango quando o garçom ofereceu, era alcoolico, mas ela quis experimentar e era bom. Acabou tomando uns três copinhos, Jin disse ser estranho a ver bebendo. Mas ela não ouviu, prestou atenção em Erin e Ryo que estavam dançando e os chamaram pra juntarem-se.

-Eles estão se divertindo bastante.

-É... – A morena falou baixo – Eu vou acabar estragando sua noite.

-Não tem como, eu já estava disposto a ficar sentado quando te convidei e eu também não sei dançar.

-É?

-É. – O clima ficou agradável pra eles naquele instante. Jin não parecia mais tímido – É fácil acostumar com o seu jeito, é até charmoso depois de um tempo. Acho que eu vou acabar gostando mesmo de...

Antes que ele terminasse Emily apareceu e puxou ambos pelos braços, fazendo-os levantarem confusos, então empurrou os dois pro meio do salão sem perguntas.

-Vão dançar crianças, senão eu dou um jeito de reprovar os dois!

Sem muita escolha e sem saber por onde começar, eles ficaram se entreolhando até alguém lhes chamar a atenção quando a musica deu uma pausa.

-Olha, a Elisha tá linda! – Aquele risinho que se seguiu fez o casal ficar interessado, era Chisame.

A loirinha era a garota mais bela daquele salão. Seu vestido era claro, com uma pinta de sensualidade, o perfume, os cabelos alvos soltos, aqueles olhos pálidos...

-A-ah.. E a Sacchi? – A morena falou a segunda coisa que lhe veio em mente.

-Tá ali! – Chisame apontou pra amiga que estava sentada em uma das mesinhas e com cara de tédio. A loira sorriu logo em seguida – Estou dançando com a Haruna.

A musica começou e ela correu para a outra amiga, os dois ficaram um tanto desnorteados acompanhando os movimentos dela.

-E agora? – Murmurou Elisha.

-Acho que é só ficar dando passos pros lados... A professora pirou.

-Ela me paga por isso. – Ele se aproximou e ela colocou as mãos sobre os ombros dele hesitantemente. Jin também tomou a sua posição, imitando as pessoas ao redor, mas sem jeito. Elisha estava bem mais constrangida que ele.

O seu toque fez ela ignorar os comentários maldosos de Irene, seu coração estava acelerado e ela olhava pra baixo, a gravata dele era feia.
Conseguiu erguer os olhos, mas ao se deparar com os dele, ela virou-se pra esquerda e foi pior, um casal se beijando. Virou-se pra direita, mesma cena. Era inevitável não ter ficado corada, ela imaginou que talvez aquele clima causasse isso, e se causasse... Suspirou e tomou coragem, olhando para o rosto do garoto.
Aquilo fez Elisha pensar no seu futuro, no seu destino. Jin era legal, gentil, simpático e bonito, quem sabe ela não poderia ser mais feliz com ele do que com Vic ou Yuna? Ela não se sentia tão a vontade com homens, mas ele era diferente dos outros, talvez valesse a pena tentar. Eles poderiam até levar uma vida estável e normal. Nunca tinha pensado em se casar até ali, mas Jin a fez abrir tal possibilidade.
Ele sorriu, como se soubesse no que ela estava pensando.

-Deixa eu adivinhar... Perto demais?

-Não... É que... – A música deu outra pausa, eles ficaram se olhando de uma forma estranha e calorosa. Era confortável até demais ficar assim...

Porem Haruna surgiu do nada e roubou o garoto de Elisha dizendo algo como “troca de par”. A morena se irritou, nem conseguiu ver a cor do vestido da menina de tão rápida.
Mas então ela sentiu um “alisar” no braço, como se estivessem lhe chamando a atenção, voltou a ficar corada quando lembrou quem era o par de Haruna.

-Sayonomi-san, sabe dançar né?

-Ah... – Ela se deparou com o rosto de Chisame dessa vez, já bem próximo. Era mais baixa, mas do mesmo jeito, aquela garota estava “causando” tanto dentro da mente da morena que ela ficou totalmente sem fala.

-Eu te ensino! – A loira sorriu animada e segurou as mãos dela, puxando-a pra ainda mais perto. Elisha não ousou contrariar, até pensou consigo mesma:
-(Cara... Tinha que ser justo ela? Isso é um teste?)

Chisame era mais graciosa que Jin nos movimentos, estavam bem próximas, a loirinha a conduzia perfeitamente. Podia sentir as mãos macias dela em contato com as suas e de vez enquando elas se esbarravam um pouco. Elisha parecia até hipnotizada por aquela menina. Seria aquela garota uma espécie de ponto fraco em questão física?
Só Victoria tinha feito a morena ficar nesse estado, mas Chisame nem precisou se esforçar muito. Paixonites se formavam só de observar assim?

-É só ficar juntinho indo pra lá e pra cá, fácil viu? – Tinha algo extremamente cativante nela, dava vontade de agarrá-la ali mesmo e deixar acontecer de tudo, Elisha estava até tremula, se perguntando o que era aquilo que aquela menina causava tanto – Eu gosto de dançar, mas a Sacchi espantou todos os meninos que me convidaram. – A morena nem estava ouvindo o que ela falava – Daí eu tive que...

Nesse momento Chisame tropeçou nos próprios pés e teria caído no chão se Elisha não estivesse na sua frente, esse deslize dela acabaria normalmente, mas por causa da sua altura a loira caiu de cara no decote de Elisha.
A morena já estava corada, mas ficou duas vezes mais por causa daquilo e Chisame ainda apoiou as mãos no busto dela ingenuamente para se afastar, por um descuido ela manteve as mãos lá mesmo depois de retomar a postura. Quatro vezes mais vermelha.

-Desculpa, escorreguei. – Ela ria estabanada – Sorte que seus peitões estavam na frente Sayonomi-san! Senão eu ia me esborrachar no chão. – Foi um comentário brincalhão, mas Elisha ficou ainda oito vezes mais vermelha do que estava – Olha os meus! Também são bons por meu tamanho né? – O olhar foi automático e olhando daquele ângulo o corpo bem definido dela... Aquela altura Elisha parecia um tomate maduro. – Haruna diz que são bonitos. Ah! Desculpa, mãozinhas bobas as minhas... – Só então ela percebeu o paradeiro das próprias mãos e tornou a segurar as de Elisha – A gente é menina, então não tem problema. Eu nem ligaria se você tocasse os meus pra descontar! – Ela riu, e por impulso ergueu as mãos da morena na altura dos seus seios. Era lentinha mesmo, só quando parou de falar ela notou o estado indescritível em que Elisha estava na sua frente. Ela soltou as mãos da “parceira” e elas ficaram naquela altura, inconscientemente. Chisame então levou uma mão para o queixo e encarou Elisha soltando palavras inocentes dos lábios – Sayonomi-san, você tá se sentindo bem?

A memória dela deu um salto depois daquilo, Elisha se viu voltando pra mesa onde a professora estava com as pernas até bambas. Não tinha ideia de como saiu da frente de Chisame, se é que saiu. Deixou-se cair sentada em uma cadeira ali e pegou a taça cheia de vinho que Emily segurava, bebendo ela inteira em poucos segundos. A mulher se assustou bastante com aquilo.

-Pensei que você não bebia.

-Eu não bebia mesmo. – O liquido ajudou sua fala a voltar, ela tinha perdido mais uma das suas nove vidas naquela hora – E a Luise?

-Não ligou ainda. Nossa Elisha, você tá roxa!

-É que apontaram umas armas pra mim lá no meio... – Foi irônica, sorte que Emily nem perguntou por detalhes. O silencio no salão e a atenção voltada para o palco indicava que era a hora do discurso feito pelo terceiro ano.

Como a classe combinou, Jin seria o “porta-voz” e lá estava ele tomando lugar na frente do microfone. Os alunos começaram a chamá-lo, fazer barulho e tirar sarro; Emily comentou com ela que Jin parecia mesmo um líder e Irene perguntou se agora ela tinha uma quedinha por aquele cara. Dessa vez ela não soube dizer.

-Primeiro eu quero que o Ryo faça silencio. – Começou ele, com a voz ecoando por todo salão, Ryo ainda ficou xingando ele, mas o resto do falatório cessou. Era engraçado que ele não ficasse nervoso com todos olhando pra ele – O pessoal do terceiro ano me escolheu pra dar uma palavrinha aqui. Eu pensei em fazer aquele discurso tradicional e falar de cada aluno da nossa classe, desde a gravata esquisita do Kaworu até a chapinha da Ariana, alias ela ficou bem assim não?

-Galinha! –
Ryo urrou lá de baixo, todos riram inclusive o próprio Jin.

-Mas eu gostaria de falar algo mais pessoal, sobre esse ano em si. Eu acho que nesse ultimo ano de escola a gente aprendeu muita coisa, até quem nós mesmos somos de verdade. Enfrentamos muita coisa, enfim, evoluímos. Uma parte da nossa jornada nesse mundo acabou e eu sinceramente vou sentir falta dela. Os festões na casa da Megumi, dos passeios que a turma da Jenny armava, dos acessórios bizarros da Sayo, dos gritinhos fofos da Chi-chan. E de fato, a gente nunca mais vai ver alguns desses colegas, nós vamos tomar rumos diferentes, mas quem sabe a gente até não se reencontre algum dia? O que eu mais queria agora era pedir algumas palmas pra pessoas que vão estar nas nossas memórias pra sempre. O louco do Joe; aquele nosso casalzinho preferido, Yuriko e Taichi; aquela menina meiga, a Yuna; e o cara mais nobre que essa escola teve como aluno, James Redriver.

As pessoas aplaudiram, alguns pais e alunos choraram, Elisha mesma bateu algumas palmas e elas foram somente para Yuna e James.

-Esse ano sem duvidas também fica na memória. Antes de finalizar, eu tenho que anunciar o rei e rainha do baile e o professor homenageado. Começando por esse ultimo a vencedora com a maioria de votos foi a carrasca bonitona que atende por Emily Locke ou Emi-sensei, pra quem gosta dos costumes japoneses que a gente adota na cidade. Suba ao palco moça!

Mais risos e a atenção deles se voltou para a mesa em que Elisha estava, Emily se levantou e foi até lá depressa, murmurou algo inaudível para Jin e se apossou do microfone, enquanto recebia um buquê de rosas de Myuki. Ela tomou postura e começou a falar sem enrolações:

-Agradeço ao carinho da turma e quero adicionar algumas coisas ao que o Jin falou. Não tive tempo de preparar um discurso, por que eu acho que estou mais nervosa que todos aqui. – Sorriu simpática – Então são palavras simples. Quero dizer que esse também foi um ano de encontros, nós encontramos pessoas que mudaram completamente nossas vidas de varias formas. Então valorizem essas pessoas, as amizades. Porque quando vocês caírem, e ainda vão cair muito nessa vida, são eles quem vão te ajudar a levantar. É por eles que se vale a pena lutar. – A professora ficou segurando as flores rentes ao peito, ninguém dava um pio, estavam ouvindo cada palavra – A escola acabou, mas a vida de vocês está apenas começando, então comecem certo! A ultima lição de casa que eu vou passar pra vocês, meus alunos, é a seguinte: Vivam sem arrependimentos, mantenham sempre a esperança e o mais importante, sejam felizes! Obrigada de verdade pessoal, também vou sentir saudades imensas de vocês.

As palavras dela foram recebidas com palmas e mais palmas, Elisha teve que admitir que foi um discursinho bom. Depois disso Emily sumiu de vista e eles anunciaram o rei e rainha, Ryo e Erin, foi até engraçado que eles tivessem ganho. Mas a morena não ficou pra dar os parabéns, a seguir viriam as danças, de acordo com o planejado os formandos iam dançar primeiro com os pais, depois com os padrinhos ou madrinhas de formatura e por fim com seus pares. Como Elisha não tinha nem pai e nem padrinho e seu par estava dançando com a mãe agora, ela se retirou dali.

Subiu para o terceiro andar onde achou uma sacada vazia, ficou lá observando a lua e sentindo aquela brisa noturna fria aconchegante, talvez fosse chover. Como ela não tinha lembranças da sua mãe, sempre fantasiou que ela fosse a própria lua quando pequena. Gostava de observá-la por isso talvez, e ficou ali por alguns longos minutos, até que alguém apareceu.

-Outra coisa que descobri: Pra te achar basta seguir o silencio. – Era Jin, de certa forma ela estava esperando ele aparecer ali – Fazendo o que aqui?

-Pensando. – Olhou pra ele de canto.

-No que?- Ele foi pro lado dela e se debruçou nas beiras, ela imitou o gesto, ainda olhando para o céu.

-No que a professora disse.

-Ela saiu com pressa da festa agora pouco.

-Hm... – Era Luise com certeza, Emily ia ter o que queria enfim. Essas horas elas já deviam estar conversando. Elisha ficou quieta, já que Jin também ficou. Ambos ficaram a olhar a lua mais alguns minutos até que a morena deixou seus pensamentos saírem, num tom de voz calmo:

-É engraçado como as coisas costumavam ser. Eu passei a minha vida escolar toda sozinha e odiando vocês, agora dizem até que eu sou legal. Eu ainda odeio a maioria, mas você, Erin, Emily, Chisame... São diferentes do que eu pensei, são gentis... Tapados e ridículos as vezes, mas gentis e legais. – Ele segurou o riso para que ela não parasse de falar – E se a minha opinião mudou assim, é culpa de duas pessoas.

-Vic?

-Victoria e Yuna, elas viraram minha vida de cabeça pra baixo.

-Yuna também? Eu lembro que você dava muito gelo nela.

-É uma história longa, eu não me orgulho de como tratava ela... Passar por tudo isso até que foi bom, eu me sinto mais forte que antes. Só preciso esquecer alguém.

-Esquecer esse alguém vai ser difícil. – Ele soltou um riso, sabia que o alguém era Victoria – Sabe, eu estou feliz.

-Por quê? – Foi curioso, fez ela se virar pra ele.

-Porque essa foi a primeira vez que você me colocou por dentro dessa sua muralha de gelo. – Ele ainda não retribuía o olhar – Eu sempre ficava imaginando o que se passava pela sua cabeça, desde a oitava série quando você deu um soco na Megumi pela primeira vez e quanto mais eu fui descobrindo agora, mais eu fiquei curioso. Acho que é como um livro bom.

-De que gênero? –
Normalmente ela ficaria mais tímida com aquele dialogo, mas se sentiu mais extrovertida. Achou que era fraca pra bebidas, ele olhou pra ela também.

-Mistério? Suspense?

-Terror ou drama. – Ficou a olhar pra ele, irônica.

-Romance?

-Talvez se você fosse menos lerdo pra tentar um beijo. –
Isso escapou, no meio daqueles chutes, não soube se tinha sido efeito do álcool, Irene ou de si mesma.

Estava obvio que ele pensava nisso e foi embaraçoso ela ter sido tão atirada. Mas quando ele riu e se aproximou ainda mais Elisha notou que não tinha sido uma frase totalmente inconsciente. Ela queria tentar... E agora que sua vida estava dando certo com as pessoas normais ela sabia que tinha uma chance de ter seu final feliz.
Sem fantasmas, bruxas, organizações ocultas, assassinatos ou explosões.
Elisha fechou os olhos e deixou os lábios dele tocarem os seus, aquele beijo não foi delicado e quente como o de Vic, foi mais carinhoso e “firme”, com um leve toque brusco. Foi diferente e curto, ela ouviu alguém chamar seu nome e se afastou dele, Erin apareceu correndo poucos segundos depois disso, com seu celular na mão.

-É a Luise! – A feição dela parecia apreensiva – Disse que quer falar com você sobre Emily e parece ser urgente.

A morena pegou o telefone e se distanciou deles, Erin olhou pra baixo e Jin coçou a nuca passeando com os olhos por elas. Assim que a garota murmurou a primeira palavra Luise iniciou o dialogo com sua voz serena.

-Ela não recebeu bem a noticia, saiu daqui correndo.

-Aconteceu algo?

-A boa noticia é que meus empregados a acharam e a má é que ela bateu com o carro. – Elisha sentiu um frio no estomago, mas Luise não a deixou falar – Ela está viva no hospital, mas eu não vou poder ficar.

-Tudo bem, eu vou pra aí.

-Desculpe estragar seu baile.

-Luise... – Ela nem queria saber mais de baile, sabia que tinha acertado o palpite, só queria uma confirmação – Isso quer dizer que...

-Sim, a filha dela era a Yuna. Fui eu quem adotei as meninas dela... E agora as duas...

-Não precisa se culpar. –
“Você sabia desde o inicio”, foi o que Irene ficava repetindo.

-Eu tive culpa Elisha, mas o que passou, passou. Tenho que ir agora.

-Tá, já estou indo. – Assim que ela desligou e virou-se Jin e Erin estavam a encarando curiosos e ela deu as noticias – A Emily sofreu um acidente de carro, eu vou lá pro hospital ficar com ela.

-Então eu vou com você. – Jin tirou o paletó do terno e cobriu Erin ao perceber que ela estava com frio e a menina disse que ia também, pra não ficar atrás.

-Não, vocês ficam e aproveitem o baile.

-Olha Elisha, a gente ta indo pra lá com ou sem você. Ela é nossa professora também. – Jin sorriu e saiu dali – Não precisa mais fazer tudo sozinha.

-É Elisha! Ir com o carro do pai do Ryo-kun é mais rápido que ir a pé. – Erin riu e seguiu o menino, deixando a morena lá.

-Tsc... – Ela cruzou os braços encarando os dois – Amigos, hm?

Era bom ter pessoas como eles por perto. Ela decidiu tentar.

Depois de terem achado Ryo, os quatro rumaram para o hospital de Sleepy Hill, foi bem rápido de carro. Na recepção foi Elisha quem tomou a frente.

-Viemos ver a professora Emily Locke, ela deve ter entrado a pouco tempo.

-Parentes dela? – O mesmo atendente frio de sempre.

-Eu moro com ela. – Foi o suficiente, eles foram guiados pro quarto, mas só Erin e Elisha puderam entrar. Parecia que estava fadada a freqüentar aquele lugar mórbido e escuro. O quarto de Emily também tinha aquele cheiro, como se a própria morte estivesse ali só esperando a hora. Aquele apitos da maquina que media os batimentos da mulher soavam incômodos na sala, Elisha se lembrou de como Emily estava bonita aquela noite, agora estava horrível. Cheia de ataduras e curativos pelo corpo.

-Que bom que ela está bem. – As duas estavam lado a lado a observando.

-Uhum.

-Elisha, a Emily é responsável, por que ela bateria com o carro?

-Ela tava abalada. – Não queria explicar, mas seria injusto com Erin.

-Por quê?

-Ela estava procurando a filha por todos esses anos e agora descobriu que era a Yuna, e ela ta morta. É normal que a professora reaja assim.

-A Yuna? – Erin ficou visivelmente assustada, Elisha confirmou com a cabeça e ela ficou ainda mais afetada com aquilo.

-Que foi?

-É que... Eu acho... – Antes que a garota pudesse terminar elas perceberam movimentações na cama, era Emily, estava de olhos semi cerrados e estendeu a mão na direção de Erin, sua voz saiu rouca e arranhada:

-Yuna... É você?

Elisha cruzou os braços novamente analisando a mulher, ela nem estava consciente.

-Ela ta delirando... Fala com ela.

-Mas eu... – Erin ameaçou chorar, mas a morena insistiu na idéia.

-Ela vai se sentir melhor se achar que falou com Yuna quando acordar... É mais fácil aceitar se ela tiver se despedido.

-Tá bem... – Erin sentou-se na cama, estava tremendo, com os olhos lacrimejando. Segurou as mãos de Emily, que pareceu reagir ao toque.

-Yuna? Eu morri?

-N-não... Você vai ficar bem. – A voz dela estava tão lenta quanto a de Emily.

-Por que eu não posso morrer com vocês?

-Você tem que seguir em frente... – Ela tinha que respirar fundo antes de falar.

-Mas você e sua irmã eram... Meus únicos motivos pra continuar. – A voz dela estava se enfraquecendo aos poucos – O que eu faço agora?

Erin suspirou longamente e abraçou Emily com cuidado, não resistiu. Elisha percebeu as lagrimas mesmo que ela estivesse tentando esconder o rosto na professora.

-Você vai achar alguém pra você e ser muito feliz! Nós duas vamos estar sempre com você... Mamãe... Então se esforce... Tá?

Emily murmurou “Yuna” mais uma vez e voltou a adormecer, Elisha achou que a amiga não soube o que dizer, mas tinha feito bem o que ela lhe pediu. Aquilo era bem melhor vindo de alguém sensível.
Depois que se afastou, Erin desabou nos braços de Elisha e a garota achou cruel ter feito tal pedido para ela. Os olhos de Erin estavam mais claros e brilhantes por causa das lagrimas talvez, ela tinha se emocionado e muito. O que a morena pode fazer foi abraçá-la forte e enxugar seus olhos.
Teria que ser forte por Erin e Emily a partir dali.
“Pobre professorinha... Melhor deixa-la descansar.”

Com Irene mais falante um pouco ela decidiu ficar no corredor um pouco pra sair daquele quarto, eis que Jin apareceu perguntando de Erin, ela tinha ido ao banheiro se recompor. Elisha tinha ficado de “vigia” do lado de fora.

-Onde você foi?

-Tem mais gente acidentada aqui.

-Quem?

-Três da nossa sala pra variar. – Ele colocou as mãos no bolso talvez por habito – Disseram que Megumi e Bianca beberam demais e acabaram atropelando a Carrie. – Ele ia parar por ali, mas Elisha ficou o encarando até ele dar mais informações – As duas estão internadas e a Carrie morreu, Leon e Amanda vieram pro hospital também.

-Vou dar uma olhada, fica aqui na porta caso a Emily precise... – E foi se distanciando pelo corredor. No livro Carrie White também morreu atropelada. Coincidência?

-Certo. – Mas ele ainda queria dizer algo – Elisha, sobre mais cedo, eu queria falar com você sobre aquilo. Quem sabe a gente pode...

-Preciso pensar... Depois a gente conversa. – Ela sabia o que ele ia pedir, mas queria estar mais tranqüila pra dar uma boa resposta.

-Tá bem, eu espero.

Ela sumiu de vista pelo corredor ainda de braços cruzados, esqueceu de perguntar onde era o quarto, mas nem precisou, ela viu Leon conversando no celular no corredor depois de caminhar um pouco. Era com a mãe de certo.
Antes que ela fosse falar com ele a porta de um dos quartos se abriu e a garota se deparou com Amanda. Não dialogava com a garota ruiva desde o tapa.

-Se safou dessa? – Nem olhou diretamente pra ela.

-Eu não estava com elas na hora. Fiquei com o pessoal no baile quando elas saíram. – Ela também cruzou os braços mirando Elisha – E a professora?

-Vai ficar bem.
-Elas também. –
A morena até preferia elas mortas – Mas isso é tão errado de alguma forma... Tão injusto.

-Por quê? –
Elisha se interessou por essa ultima frase.

-Mesmo estando bêbadas, sem carteira de motorista elas não assumem a culpa, dizem que foi Carrie que entrou na frente e que a culpa é dela e outras coisas absurdas. Você não acha isso injusto Sayonomi? – Era mesmo muito interessante, Amanda, a mais venenosa das três estava indignada de verdade com algo do tipo – A menina era quieta e ficava na dela o tempo todo, não fazia mal a uma mosca, devia ter até muitos sonhos e acaba morta por irresponsabilidade dos outros? Antes eu não ligaria, mas agora que eu parei pra pensar na gravidade dessas coisas, é revoltante... – Ela tomou fôlego e arrumou o cabelo – Até me sinto mal por ter humilhado tanto ela na escola. Acho que abri os olhos, a gente não tem direito de tirar a vida de ninguém nem por acidente. Viver desse jeito não compensa, eu não quero mais ter uma vida dessas... Ser só mais uma chapada popular cheia de amor pra dar. Quero ser respeitada, amar e ser amada de verdade, ser útil pro mundo. – Ela sorriu pra Elisha, foi o primeiro sorriso amistoso que ela deu para a morena, que ficou com uma cara esquisita diante de tantas palavras – E se for pra ter sucesso nessa questão, eu quero ser reconhecida por isso. – Tocou a própria cabeça com o indicador – E não por isso. – Por fim deu um leve tapa nos quadris, rindo.

Elisha soube que aquele gesto foi pra provar que ela tinha mudado e pra esquecer as desavenças entre elas, mas Amanda nunca iria conseguir arrancar um sorriso simpático da garota, mesmo que ela estivesse satisfeita com aquela mudança de personalidade.

-Culpa sua e do James. Obrigada, Sayonomi. – Ela saiu dali, tocando de leve o ombro da morena e soltando uma frase de despedida – Você sem duvidas é pior que a Megumi.

Ela sabia que era... James iria ficar orgulhoso se tivesse ouvido sua irmã agora, quem disse que milagres não aconteciam?
Elisha soltou um “hump” esboçando um sorriso de canto, saindo dali também, decidiu voltar para o quarto de Emily e ver se Erin já estava bem.
No meio do caminho Irene disse que aquela noite estava agradável e Elisha pensou que só faltava aparecerem duas pessoas que sumiram pra ficar perfeito.
Parou sobre aquele chão polido, em frente a um grupo de janelas que quase cobriam as paredes daquela parte do corredor por todo, ficou observando o pátio onde os doentes passeavam as vezes, lá em baixo no térreo. Estava vazio e escuro, sinistro, mórbido, ela via alguns vultos cruzarem o lugar na escuridão, pingos começaram a cair no vidro das janelas, ia chover.
No fim das contas Emily também tinha o sangue puro dos lideres da Black Rose, a mulher disse ser inglesa, mas talvez sua família nem soubesse que tinha tal linhagem. Luise mencionou a Europa, Japão e Irlanda; como lá era América, parecia que a Black Rose estava em todo lugar, parecia que tudo aquilo que estava acontecendo era uma trama dos membros dela. Até a sua professora tinha um tipo de ligação com aquelas pessoas incomuns e perigosas.
A chuva começou forte, com trovões estrondosos, as janelas já estavam escorrendo água sem parar pelo lado de fora e Elisha ficou a olhar seu reflexo no vidro embaçado pelo frio. Entre alguns raios ela viu sua imagem se distorcer de novo, naquela figura pálida de olhos inteiros negros e de boca costurada, com um sorriso demoníaco que ela mesma havia batizado de Irene.

-Porque a líder de algo tão grande assim me visitaria por acaso?

-Não existe acaso. – O reflexo respondeu com a boca imóvel.

-E o que você acha então?

-Que você vai descobrir logo.

Irene riu, mas isso não a assustou, o susto veio de um grito que lhe chamava a atenção. Ryo era um idiota mesmo, podiam expulsar ele do hospital por isso.

-Sayonomi, até que enfim te achei! – Estava com pressa e uma cara preocupada.

-Que houve?

-Tenho uma noticia ruim e outra pior. Escolhe!

-Fala de uma vez. – Não estava paciente pras brincadeiras dele.

-A ruim é que eu não to conseguindo resolver a pior.

-E a pior? – Ryo coçou a nuca com medo de dizer.

-É a Erin, ela sumiu. Já procurei em todo lugar, inclusive o banheiro feminino e não achei. – Ele fuçou o terno procurando algo e quando achou Elisha tomou um susto mil vezes maior que o anterior – Mas acho que ela deixou essa flor no banheiro pra você, tava escrito seu nome de batom no espelho em cima dela. Acha que é uma pista de onde ela pode ter ido?

Tudo realmente estava indo bem demais, normal demais. No fundo ela sempre soube que ela tinha se metido em um assunto que não devia e agora não podia voltar atrás.
Era tarde demais pra ter finalmente conseguido se encaixar na sociedade e querer ser feliz como uma menina normal.
Uma vida estável, família, namoro, emprego...
Era tarde demais pra tudo isso.

Ela sabia que nunca conseguiria fugir daquilo.
A flor que Ryo encontrou no banheiro onde Erin estava era uma rosa negra.

2 comentários:

  1. Otimo impacto que esse causou também. =) Acho que ficou bom, algumas pessoas ficaram felizes com o envolvimento da Elisha + Jin, outras falaram que a parte mais marcante da historia foi um dos trechos desse cap.

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  2. Ótimo?
    Nossa, eu fiquei toda empolgada com algumas partes, mas depois me deu até raiva. ¬.¬'
    Concerteza foi bem marcante mesmo, mas que deu raiva depois ahhh deu...

    O começo foi tudo tão perfeito, as partes com o Jin foram as mais emocionantes. *----*
    Mas a Chisame tinha que aparecer para atrapalhar, aff... Que raiva.
    Depois quando os dois estão lá denovo e surgiu um beijo, AFFF, Emily no hospital, putz... O cara não tem sorte mesmo e você tinha que cortar o barato né J. FUUUU!!! ¬¬'

    E revoltante a indiferença com a Carrie, a coitada era a diferente, único patinho feio e pouco depois de sua aparição, ela morre. Eu é quem quis morrer quando li isso. -___-'

    Foi uma boa a mudança da Amanda, ela precisava levar um 'choque' desses mesmo.

    Estou pegando raiva desse povo macabro e assassinos da Black Rose. FUUUUUU!!!!!!!!!!!! Ò_ó



    D.

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